Hoje, no caminho de volta pra casa, curtindo o Acústico Cássia Eller, disco que me acompanha assiduamente desde que foi lançado, lembrei que a saudosa artista se foi deste plano há praticamente dez anos. Tentei não acreditar, pois a lembrança daquele dia continua tão viva para mim, que parece ter sido ontem. Angústias com o meu envelhecer à parte, novamente comecei a pensar no fenômeno que ocorre sempre que um artista ou alguém de peso se vai.
Em geral, logo que eles morrem há aquele bombardeio da mídia. Estas personalidades, se já não estavam mais no topo, voltam meteoricamente a ele. Novos fãs aparecem, os seguidores fiéis continuam lá firmes e os que nunca cultivaram nenhuma admiração por estas figuras, aproveitam a oportunidade para destilar a sua antipatia, muitas vezes utilizando de argumentos irracionais, puxando sempre para a vida pessoal destes. Quando a Cássia morreu, ouvi de um colega que uma drogada homossexual não deveria servir de exemplo para a juventude. Que eu deveria esconder a revista que levava a foto dela na capa. Preferi ignorar, como ignorei muitas outras vezes depois.
Michael Jackson partiu, e, de repente, ser fã dele passou a ser “cool”. Nas fases obscuras da sua carreira, abrir a boca pra falar que era seu fã significava ser apedrejado. Felizmente, muitos dos que antes atiravam pedras, hoje o admiram, quer por verdadeira afinidade, quer por apenas ficar bem na fita, mas isso faz parte das voltas que o mundo dá.
A Amy Winehouse é um caso muito recente. Enquanto uma pequena parte respeitosamente celebrava a sua memória nas redes sociais, a maioria moralista ou curiosa fazia questão de passar as suas fotos do antes e depois, como exemplo a não ser seguido, sequer abrindo um parêntese para o seu grande talento. E o caso do Steve Jobs? Ele bate a caçoleta, milhares de pessoas que já tinham um IPHONE há tempos e sequer sabiam quem ele era, automaticamente viram fãs incondicionais do cara. Passeiam até pelos shoppings vestidos com as camisetas que levam a sua caricatura estampada.
Eu posso estar misturando demais as idéias, mas primeiramente acho que deveríamos nos educar a saber separar o homem do artista. Artistas indiscutivelmente talentosos e dignos de admiração, não necessariamente são exemplos de seres humanos perfeitos, mesmo porque não há regra alguma que imponha isto. O que realmente importa é reconhecer, bater palma, tirar o chapéu para o seu talento que ficou documentado, sacramentado. Virou legado. Em segundo lugar, uma coisa que me incomoda enormemente nem é esta automática mitificação pós morte, mas a completa falta de personalidade e sensibilidade das pessoas diante deste fenômeno midiático. Como é fácil ver gente sem opinião própria, sem ousadia, sem conteúdo. Há de surgir o dia em que celebraremos a partida da Maria vai com as outras da face da terra, com toda cobertura e atenção a que temos direito.
Valeu, Cássia Eller!! Pela poesia, pela voz, por fazer tudo vir a ser autoral, pela ousadia e força!
Dei esta cusparada de fim de noite inspirado em você!!
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